Sabe-o quem por escolas andou e disso tirou algum proveito, que na Natureza, na Vida em suma, “nada se perde, nada se cria: tudo se transforma”. Tudo muda, pois, em mudanças tantas que atingem as vontades, como diria o nosso Épico uns séculos do sábio Darwin ter disso feito a Lei Universal da criação, mudanças na verdade tantas e tamanhas que, pela natural evolução de tudo o que é vivo, embotadas as vontades, vem a reboque a destruição dos (bons, em primeiro lugar) costumes e usos. Restarão, aqui e além, alguns resquícios que por comodidade alguns lhes chamam de “folklore” (hoje, made in Coreia do Sul, já se vê...).
Assim, também o hábito do protesto, poder e direito populares antigos, legítimos, saudáveis, vai-se perdendo aos poucos, mudando-se para um coro de ”améns”, inclusive face a eventuais desacatos ou agressões prepotentes infligidos num processo que, evoluindo à sorrelfa, vai tornando o Povo cada vez mais “distraído”. (o dos “brandos costumes” ou, melhor, do nacional “quer cá saber”... atolado nos futebóis e “fadunchos” dos seus entretenimentos, não dará pelo que se passa à sua volta. E até nesta pacatíssima (?) aldeia de Azenhas do Mar chamada – já sem propriedade desde que “mudaram” o destino do velho e milenário moinho de água, orgulho e brasão de seus ancestrais, mas ignorado, nos nossos dias, pelos que recebem ordenados para salvaguardar patrimónios nacionais e culturais, construídos ou naturais. Aquele bem colectivo, o último dos cinco que por cá fizeram o pão que a tantos alimentou – e à terra deram o nome – acabou tornado (“mudanças dos novos tempos) “casa de comes e bebes” – perdão: de torradas e chás, pois será mais fina e apropriada esta designação. Com os ”améns” das nossas autarquias.
Tem, pois, Azenhas do Mar, uma “casa de chá”; não terá passeios para protecção dos seus (muitos) velhos e crianças, nem sinalizações verticais ou horizontais nos sítios onde é perigoso passar, nem terá a solução civilizada de redes subterrâneas, em vez das primárias e “terceiromundistas” teias de emaranhados cabos (armados ou não) em ondulantes catenárias sobre nossas cabeças, conspurcando-nos, para já, – se não a saúde – a visão das suas tão decantadas (por pintores e poetas) paisagens, com esta densa tessitura, suportada pelas centenas de postes em betão e/ou madeira (homenagem das nossas Câmaras Municipais a Bordalo Pinheiro, a povoação num gigantesco “paliteiro” das Caldas?).
Mas as “mudanças” – desacatos ou agressões? – não se têm ficado por aqui, passada e ganha que foi a guerra do povo contra a “Induca”, ou lá como isso se chama, quando projectou meter duas retretes dentro da sala de aulas da bela “Escola Primária Oficial” (e com “respiração” para o seu interior!) e manda arrancar o belo lambril de madeira exótica trabalhado (“riga”), um rico pormenor arquitectónico do projecto original dessa escola que foi considerada “a mais bela do país” até por um presidente da República Portuguesa. Um colega nossa (pois até na nossa profissão de construtores há destruidores), funcionário da Câmara ou da tal “Induca” (são sempre os mesmos), empossado de autoridades que ninguém inteligente ou culto lhe teria dado, e destruirá gratuitamente assim, sem respeito, um elemento importante do projecto de outrem, valioso pormenor a um tempo decorativo e funcional, em desprezo do mais elementar princípio da deontologia profissional – só por prepotência (ou ignorância?) – obrigará, agora, o Estado – todos nós... – a pagar mais energia eléctrica com maiores gastos de aquecimento e desumidificação da sara, dado o microclima local, onde a proximidade do mar não será a de menor incidência. (A Ordem dos Arquitectos devia ter tratamento próprio para estes procedimentos).
O autor do projecto original, artista e pedagogo emérito, reformados do ensino técnico criando então em novas escolas – as de “artes decorativas” – novas disciplinas de grande importância para o país, mestre e formador dos mais prestigiados artistas contemporâneos, já morreu; aqui, nesta aldeia, foi oficial e solenemente homenageado com monumento e nome em topónimo, primeiro num largo e mais tarde, “mudados os tempos”, para a rua, aliás, carreiro; mas ainda há testemunhos do impacto que nestas terras teve o seu projecto – gratuitamente elaborado – de quem nele trabalhou e quem destas coisas sabe; mas Azenhas do Mar – no “fim do mundo” – que vai vendo finando- se protestos e revoltas, só tem um caminho: nas próximas eleições, expressar suas vontades por “mudanças de tempos e vontades” (e agora o “ámen” seria nosso), o que é bem necessário, pois “nós por cá” temos mais aspectos insólitos a apontar, o que fica para mais tarde, espero. Bem, somos do tempo em que todos os anos se comemorava a “Festa da Árvore”; os alunos de Lisboa iam à Serra de Monsanto plantar uma e em anos seguintes, a família levava-nos a ver como ela crescera, limpar das “caldeiras”, arrancando as ervas daninhas, cortais eventuais ramos secos (a poda era só isso); aprendia-se, enfim, a estimá-las, a amá-las, numa espécie de salutar culto seguido, segundo os nossos professores de então, pelos países civilizados, uma espécie de índice, de grau civilizacional.
Tempos antes, os do Marquês de Pombal por exemplo, as árvores eram protegidas como se pode ver numa postura do município de Setúbal do ano de 1718, na sua grafia original:
«Que nenhuma pessoa possa cortar choupo ou álamo dos que novamente se andam pondo e ao deante se pozerem, no campo do Rocio, que vai para o senhor do Bom Fim nem possa cortar ramos das árvores que já estão postas e criadas em o dito campo e laneda; com pena de que sendo peão será publicamente açoutado com baraço e pregão e degradado dois anos para África; e sendo pessoa de maior qualidade a que fizer o dito cortamento, incorrerá em o mesmo degredo, com pregão em audiência e ruas; e outros serão condenados em vinte mil réis, metade para o acusador e metade para o Concelho».
Outros tempos, pois, os do Marquês de Pombal, que muita falta nos faz hoje e aqui... onde havia grande quantidade de plátanos em frondosas áleas a bordejar o Rio dos Moleiros e no sítio do “Bengalas”. Mudados os tempos, com as novas apropriações dos “baldios” e a raiva que entretanto se foi abatendo sobre as nossas árvores, restam- nos apenas dois exemplares dessa espécie (uma das 17 mais raras do planeta)... coitadas pois todos os anos, qual novo ritual de verão, a nossa Junta desloca dois ou três trabalhadores, uma camioneta, vários instrumentos apropriados para o efeito e, em senha assassina, corta-lhes as copas, para que não mais cresçam e com a sua característica verticalidade assim truncada, não possam vir a criar invejas aos que por cá andam com a “espinhela” torcida, ao peso de suas muitas culpas...
Azenhas do Mar, primeira metade do século XXI,
Francisco Castro Rodrigues
Assim, também o hábito do protesto, poder e direito populares antigos, legítimos, saudáveis, vai-se perdendo aos poucos, mudando-se para um coro de ”améns”, inclusive face a eventuais desacatos ou agressões prepotentes infligidos num processo que, evoluindo à sorrelfa, vai tornando o Povo cada vez mais “distraído”. (o dos “brandos costumes” ou, melhor, do nacional “quer cá saber”... atolado nos futebóis e “fadunchos” dos seus entretenimentos, não dará pelo que se passa à sua volta. E até nesta pacatíssima (?) aldeia de Azenhas do Mar chamada – já sem propriedade desde que “mudaram” o destino do velho e milenário moinho de água, orgulho e brasão de seus ancestrais, mas ignorado, nos nossos dias, pelos que recebem ordenados para salvaguardar patrimónios nacionais e culturais, construídos ou naturais. Aquele bem colectivo, o último dos cinco que por cá fizeram o pão que a tantos alimentou – e à terra deram o nome – acabou tornado (“mudanças dos novos tempos) “casa de comes e bebes” – perdão: de torradas e chás, pois será mais fina e apropriada esta designação. Com os ”améns” das nossas autarquias.
Tem, pois, Azenhas do Mar, uma “casa de chá”; não terá passeios para protecção dos seus (muitos) velhos e crianças, nem sinalizações verticais ou horizontais nos sítios onde é perigoso passar, nem terá a solução civilizada de redes subterrâneas, em vez das primárias e “terceiromundistas” teias de emaranhados cabos (armados ou não) em ondulantes catenárias sobre nossas cabeças, conspurcando-nos, para já, – se não a saúde – a visão das suas tão decantadas (por pintores e poetas) paisagens, com esta densa tessitura, suportada pelas centenas de postes em betão e/ou madeira (homenagem das nossas Câmaras Municipais a Bordalo Pinheiro, a povoação num gigantesco “paliteiro” das Caldas?).
Mas as “mudanças” – desacatos ou agressões? – não se têm ficado por aqui, passada e ganha que foi a guerra do povo contra a “Induca”, ou lá como isso se chama, quando projectou meter duas retretes dentro da sala de aulas da bela “Escola Primária Oficial” (e com “respiração” para o seu interior!) e manda arrancar o belo lambril de madeira exótica trabalhado (“riga”), um rico pormenor arquitectónico do projecto original dessa escola que foi considerada “a mais bela do país” até por um presidente da República Portuguesa. Um colega nossa (pois até na nossa profissão de construtores há destruidores), funcionário da Câmara ou da tal “Induca” (são sempre os mesmos), empossado de autoridades que ninguém inteligente ou culto lhe teria dado, e destruirá gratuitamente assim, sem respeito, um elemento importante do projecto de outrem, valioso pormenor a um tempo decorativo e funcional, em desprezo do mais elementar princípio da deontologia profissional – só por prepotência (ou ignorância?) – obrigará, agora, o Estado – todos nós... – a pagar mais energia eléctrica com maiores gastos de aquecimento e desumidificação da sara, dado o microclima local, onde a proximidade do mar não será a de menor incidência. (A Ordem dos Arquitectos devia ter tratamento próprio para estes procedimentos).
O autor do projecto original, artista e pedagogo emérito, reformados do ensino técnico criando então em novas escolas – as de “artes decorativas” – novas disciplinas de grande importância para o país, mestre e formador dos mais prestigiados artistas contemporâneos, já morreu; aqui, nesta aldeia, foi oficial e solenemente homenageado com monumento e nome em topónimo, primeiro num largo e mais tarde, “mudados os tempos”, para a rua, aliás, carreiro; mas ainda há testemunhos do impacto que nestas terras teve o seu projecto – gratuitamente elaborado – de quem nele trabalhou e quem destas coisas sabe; mas Azenhas do Mar – no “fim do mundo” – que vai vendo finando- se protestos e revoltas, só tem um caminho: nas próximas eleições, expressar suas vontades por “mudanças de tempos e vontades” (e agora o “ámen” seria nosso), o que é bem necessário, pois “nós por cá” temos mais aspectos insólitos a apontar, o que fica para mais tarde, espero. Bem, somos do tempo em que todos os anos se comemorava a “Festa da Árvore”; os alunos de Lisboa iam à Serra de Monsanto plantar uma e em anos seguintes, a família levava-nos a ver como ela crescera, limpar das “caldeiras”, arrancando as ervas daninhas, cortais eventuais ramos secos (a poda era só isso); aprendia-se, enfim, a estimá-las, a amá-las, numa espécie de salutar culto seguido, segundo os nossos professores de então, pelos países civilizados, uma espécie de índice, de grau civilizacional.
Tempos antes, os do Marquês de Pombal por exemplo, as árvores eram protegidas como se pode ver numa postura do município de Setúbal do ano de 1718, na sua grafia original:
«Que nenhuma pessoa possa cortar choupo ou álamo dos que novamente se andam pondo e ao deante se pozerem, no campo do Rocio, que vai para o senhor do Bom Fim nem possa cortar ramos das árvores que já estão postas e criadas em o dito campo e laneda; com pena de que sendo peão será publicamente açoutado com baraço e pregão e degradado dois anos para África; e sendo pessoa de maior qualidade a que fizer o dito cortamento, incorrerá em o mesmo degredo, com pregão em audiência e ruas; e outros serão condenados em vinte mil réis, metade para o acusador e metade para o Concelho».
Outros tempos, pois, os do Marquês de Pombal, que muita falta nos faz hoje e aqui... onde havia grande quantidade de plátanos em frondosas áleas a bordejar o Rio dos Moleiros e no sítio do “Bengalas”. Mudados os tempos, com as novas apropriações dos “baldios” e a raiva que entretanto se foi abatendo sobre as nossas árvores, restam- nos apenas dois exemplares dessa espécie (uma das 17 mais raras do planeta)... coitadas pois todos os anos, qual novo ritual de verão, a nossa Junta desloca dois ou três trabalhadores, uma camioneta, vários instrumentos apropriados para o efeito e, em senha assassina, corta-lhes as copas, para que não mais cresçam e com a sua característica verticalidade assim truncada, não possam vir a criar invejas aos que por cá andam com a “espinhela” torcida, ao peso de suas muitas culpas...
Azenhas do Mar, primeira metade do século XXI,
Francisco Castro Rodrigues
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