Artigo de Opinião

Oportunidades de uma Sintra rural... que se vão perdendo

Casas saloias


Nestes tempos de globalização dão-nos oportunidades de, por um lado, sabermos o que se faz longe de nós, assim como de podermos ter opinião sobre o que queremos para nós próprios e para o sítio onde moramos. A prática e a reflexão têm-nos demonstrado como é no entanto importante a necessidade da manutenção de sinais de identidade e distinção de forma a sustentar o sentimento de pertença. Custa-nos entender as oportunidades desbaratadas em preservar esta distinção e a tipificação, entre outros legados, do património arquitectónico popular local. Em várias localidades do país já vimos este património conservado e reutilizado com proveito a todos os níveis: ou seja estético, social, cultural e económico em prol do desenvolvimento e da modernidade. Parece-nos importante que na zona rural de Sintra se pudesse pensar este aspecto alargando a preservação das suas capelas, igrejas e fontes recuperadas pelo município, ao que poderemos designar por arquitectura saloia.

Assim estranhamos o que exemplificam as fotografias, onde se pode ver uma ruína que mereceria uma solução inovadora que respeitasse a sua matriz ser substituída por uma construção que pelas suas características e dimensões irá apagar a traça original, além de alterar o equilíbrio e harmonia da praça em que se insere. Nesta mesma praça, vimos uma construção saloia bem preservada.

A casa saloia é descrita na obra da Associação dos Arquitectos Portugueses Arquitectura Popular em Portugal, editada pelo Sindicato Nacional dos Arquitectos, Lisboa, 1980. Ela também é descrita por vários autores como Vítor Serrão, em Sintra, Editorial Presença, 1.ª edição, Lisboa, 1989. Como exemplo de preservação desta arquitectura aplicada a uma pequena aldeia podemos citar a Aldeia da Mata Pequena, no concelho de Mafra, recuperada por Diogo Franco, neto do famoso ceramista José Franco.

Pergunto-me que interesses ou falta deles levam a que se continue a deixar o incaracterístico betão substituir o que poderia ser recuperado, impondo-se com dimensões pouco harmoniosas, descaracterizando largos e paisagens. Esta recuperação e preservação do património arquitectónico rural não tendo o grau de complexidade de localidades com grandes riquezas patrimoniais, como Sintra aqui tão perto, levar-nos-ia a supor uma intervenção e aproveitamento facilitado sem necessitar do recurso ao tradicional comando central do grande poder económico mais habituado a construir de raiz do que a intervir sobre um património já edificado, e recuperá-lo para a vida actual. A comunidade apoiada pelo município conserva alguma da sua arquitectura saloia assim como outros traços de cultura local, mas que dizer dos moinhos que parecem já não mover os interesses de outros tempos, dos quilómetros de muros de pedra seca, verdadeira obra monumental quando considerada no seu conjunto ou outras construções quer habitacionais quer de apoio à lavoura?


Antiga casa em ruína



Nova casa em construção



Casa saloia mantida


Texto e fotos: Claire Smith

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